quarta-feira, 19 de novembro de 2008

INTRODUÇÃO

A partir da última metade do século XX se intensificou o debate em torno de questões ecológicas, tendo como hard core das discussões os efeitos entrópicos da atividade econômica sobre o meio-ambiente por meio de exploração de fontes de sintropias positivas e a evidência de uma crise sistêmica. Quer dizer, intensificou os impactos ecológicos decorrentes da atividade industrial, do processamento de recursos naturais. Esse debate interessou a vários segmentos, desde organismos internacionais como a ONU (Organização das Nações Unidas), por meio de programas de Formação Ambiental e Educação Ambiental, bem como gerando preocupações crescentes em intelectuais de várias áreas, sobretudo relacionados à Física, à Biologia e à Economia.
A teoria econômica keynesiana atesta que os incrementos nos níveis de investimentos são indispensáveis para o aumento de bem-estar social. A aplicação desta teoria através da política econômica, monetária ou fiscal, fora intensificada em várias partes do mundo a partir da década de 1930, mais intensamente a partir de 1945. Entretanto, tais políticas, com o intuito de gerar crescimento econômico, têm sido realizadas de forma insustentável, se caracterizando por intensificar impactos ecológicos ou a desordem fora do sistema econômico, por meio de estímulos à demanda agregada, gerando utilização intensa de recursos naturais e emissão de externalidades negativas, ou seja, ignorando os custos sociais e ambientais deste bem-estar.
Mediante crescente desigualdade social e crise ecológica, bem como suas implicações, economistas e formuladores de políticas não conseguem obter respostas, tampouco solucionar ou equacionar tais problemas, por meio de suas teorias. Sendo assim, devido à relevância em que se reveste o problema, a temática deste trabalho situa-se no âmbito da Economia e Complexidade. Temos como objetivo geral apresentar a Avicennia como um modelo perfeitamente sustentável aos sistemas sociais, no caso aqui, às economias nacionais. Nosso objetivo maior, portanto, é apresentar à partir da Teoria da Autopoiese e da Avicennia um modelo perfeitamente sustentável às economia nacionais, de tal forma que seu acontecer ocorra gerando o mínimo dano sobre o meio. Para isto torna-se necessário:
a) Analisar a Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda; b) Analisar a Teoria Geral dos Sistemas Vivos (TGSV) e a teoria das Estruturas Dissipativas; c) Apresentar, mediante a Teoria das Estruturas Dissipativas impactos ecológicos intensificados pela aplicação do modelo de crescimento econômico keynesiano; d) Apresentar a Teoria da Autopoiese; e) Apresentar a Avicennia e f) Apresentar à partir dos princípios da Avicennia um modelo de sustentabilidade perfeita às economias nacionais.
O trabalho fora elaborado mediante a hipótese de que à partir da teoria da Autopoiese (a teoria que explica a vida) e da avicennia, mais especificamente por meio dos conceitos de laços retroalimentadores, redes, parceria, reciclagem, estabilidade, dentre outros possa se inferir um conceito ideal de sustentabilidade aos sistemas econômicos.
Ao notar que as interações entre sistema capitalista e Sistema de Gaia ocorrem em forma de rede, onde um impacto tende a se espalhar no meio de forma ampliada, a metodologia eleita consiste na revisão teórica de autores ligados à teoria geral dos sistemas vivos como Fritjof Capra, Ylia Prigogine, Humberto Maturana e Francisco Varela, bem como a obra "A Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda" do economista John Maynard Keynes.
O trabalho fora organizado em duas partes. Sendo que o objetivo da primeira é apresentar mediante a Teoria das Estruturas Dissipativas como as políticas de caráter keynesianas eleva a utilização e a deterioração dos recursos naturais e intensifica os impactos ecológicos em todo Sistema de Gaia. Portanto, esta parte fora subdividida em três capítulos, onde no primeiro, busca-se apresentar com base na obra "A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda"; do economista John Maynard Keynes, a fundamentação teórica ao comportamento interventor do Estado, por meio de políticas econômicas expansionistas como possuidor de importância fundamental para elevar os níveis de investimentos, emprego e crescimento econômico, deslocando a economia em direção ao pleno emprego dos fatores de produção.
No segundo capítulo, serão apresentadas as evoluções no campo da Biologia, a partir da década de 1920, que culminaram com a elaboração da Teoria das Estruturas Dissipativas como própria para descrever sistemas abertos e afastados do equilíbrio. Apresenta, ainda, características das economias capitalistas que as torna possíveis de serem tratadas pela referida teoria, por se tratar de um sistema dinâmico, aberto a fluxos de matéria e energia.
No terceiro capítulo, caracterizamos, mediante a teoria das estruturas dissipativas, a aplicação das políticas econômicas de inspiração keynesiana como intensificadoras dos impactos ecológicos. Apresentamos mudanças estruturais ocorridas no meio em função das mudanças estruturais no sistema econômico, que, por sua vez, apresentam efeitos no sistema econômico decorrentes destas mudanças no meio-ambiente, tais como inflação de custos e aumento da demanda por bens públicos.
Já a segunda parte tem como objetivo aplicar os princípios da vida, ou seja, da Teoria da Autopoiese, mais especificamente da Avicennia às políticas de caráter keynesianas. Portanto, no primeiro capítulo será apresentada a Teoria da Autopoiese enquanto modelo capaz e suficiente para entender o conceito de sustentabilidade, e ainda, como modelo que define a vida tal como tratado por Maturana e Garcia (1997). Neste mesmo capítulo apresentamos características autopoiéticas da Avicennia que a representa como um modelo perfeito de sustentabilidade.
E finalmente, no segundo e último capitulo tento migrar para os sistemas econômicos os princípios da Avicennia como alternativa ao fechamento dos fluxos de materiais e energia, garantindo assim a capacidade de auto-organização do Sistema de Gaia.

2 TEORIA KEYNESIANA




PRIMEIRA PARTE
COMO AS POLÍTICAS DE ESTÍMULO A DEMANDA AGREGADA INTENSIFICAM OS IMPACTOS ECOLÓGICOS EM TODO SISTEMA DE GAIA





Segundo a teoria keynesiana a propensão dos agentes a poupar é responsável pelas crises e desemprego e determina as oscilações no ciclo econômico. Desta forma, a intervenção do Estado assume importância fundamental para manter ou restabelecer os níveis de emprego, minorando as crises. Levando em consideração esta premissa, o capítulo tem como objetivo apresentar aspectos da teoria keynesiana que enfatizam a intervenção do Estado na economia, por meio de políticas fiscais e monetárias expansionistas, com o objetivo de elevar os níveis de investimento e, consequentemente os níveis de emprego e crescimento econômico.
De acordo com Silva (1996) [1], mediante os fenômenos ocorridos na década de 1930, por ocasião da quebra da bolsa de Nova Iorque, Keynes se afasta da ortodoxia, criticando a Lei de Say[2], e segue em direção a construir os fundamentos teóricos que legitimassem a ação estatal na economia, com o intuito de elevar a produção e emprego.
[1] Introdução à Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda
[2] De acordo com Sandroni (2000) conhecida também como A lei dos mercados, estabelece que a oferta cria sua própria demanda, impossibilitando uma crise geral de superprodução. O equilíbrio econômico ocorre quando a soma dos valores de produção de todas as mercadorias é igual à soma dos valores dos valores de todas as mercadorias compradas. Ao ser criado um produto está ao mesmo tempo abrindo um mercado para outro produto do mesmo valor. Sendo assim, a economia capitalista seria auto-ajustável.
Gráfico 01 – Equilíbrio entre Oferta e Demanda Agregada


Fonte: Dornbusch e Fischer, (2002, p.29)

A dinâmica ocorre de forma que, se os empresários percebem oportunidades de realizarem seus lucros, contratam fatores de produção e ofertam bens e serviços no mercado, em resposta a uma demanda por parte dos consumidores. A oferta é feita, então, mediante a expectativa dos empresários terem no futuro suas receitas realizadas. Quando os empresários vendem todos os seus produtos e a demanda é satisfeita, diz-se que houve equilíbrio entre oferta e demanda agregada. No gráfico 01 este ponto é representado pelo ponto E.
Se a Demanda Agregada (DA) for menor que a Oferta Agregada (OA), ou seja, se a procura por bens for menor do que o que está sendo ofertado no mercado, os empresários farão a revisão de suas expectativas quanto a rendimentos e lucros futuros, reduzindo seus estoques e demitindo funcionários, ofertando assim uma quantidade menor de bens e serviços até que a economia encontre um novo equilíbrio. Este cenário é representado no gráfico 01 pela variação de Y para Y1 ou o ponto E1 . Caso o contrário ocorra, se a demanda agregada for maior que a oferta agregada, os empresários revisarão seus projetos de investimento, elevando o volume de investimentos e de emprego. A economia tenderá a deslocar-se para o ponto E2, representado pela variação de Y para Y2. Este ponto é denominado ponto de pleno emprego ou ponto de demanda efetiva.
Entretanto, para Keynes (1996), o pleno emprego trata-se de um caso particular, ocorrendo muito raramente e o equilíbrio entre oferta agregada e demanda agregada abaixo do pleno emprego é o caso geral, que ocorre comumente. Desta forma, Keynes, ao criticar a lei de Say, critica, então, os postulados clássicos que presumem o pleno emprego dos fatores de produção, bem como a hipótese de que existiriam apenas duas formas de desemprego, o voluntário ou o friccional, propondo o conceito de desemprego involuntário, onde,

no caso de uma ligeira elevação dos bens de consumo de assalariados relativamente aos salários nominais, tanto a oferta agregada de mão de obra disposta a trabalhar pelo salário nominal corrente quanto a procura agregada da mesma ao dito salário são maiores que o volume de emprego existente. (KEYNES, 1996, p. 53).

De acordo com Keynes (1996), quando a renda agregada aumenta, aumenta também o consumo, mas não tanto quanto a renda. Isto quer dizer que, os agentes, donos dos fatores de produção (terra, trabalho e capital), resolvem poupar parte de seus rendimentos (aluguéis, lucros e salários). Tal fenômeno ocorre devido ao fato de que, em certos momentos, as famílias, detentoras dos fatores de produção, logo da renda, optam por poupar parte de seus rendimentos.
Quando os agentes optam pela poupança, abstendo-se do consumo, é gerado um problema denominado insuficiência de demanda ou conhecido também pelo problema da realização, onde justamente devido a aumentos na poupança, os empresários, por sua vez, deixam de realizar parte das receitas esperadas e têm suas margens de lucros reduzidas. Sendo assim, reagem reduzindo seus estoques, minorando a produção e efetuando demissões. A curva de demanda agregada migra para a esquerda, representada pelo ponto E1 no gráfico 01 e tem início um período recessivo no ciclo econômico com um nível maior de desemprego.
Já Hunt (1987) descreve esta mesma dinâmica como um fluxo circular, de tal forma que, num determinado período, todo o valor gasto na produção é igual ao valor da renda, pois os empresários, ao produzirem, contratam os fatores de produção, pagando às famílias salários, lucros, juros e aluguéis. Aos donos dos fatores de produção, os custos de produção são denominados renda, com os quais adquirem bens e serviços. Conclui-se, então, que o valor agregado da renda é igual ao valor agregado do produto. Sendo assim, há um fluxo circular que vai das famílias para as empresas na forma de pagamento por bens e serviços e das empresas para as famílias na forma de rendimentos.
No entanto, este processo, de acordo Hunt (1987), no momento em que o fluxo monetário vai das famílias para as empresas, pode ser interrompido por meio de vazamentos, a saber, pagamentos a produtos importados, pagamentos de tributos ou por meio de poupança realizada pelas famílias. Estes vazamentos no fluxo de renda e gastos afetam as expectativas dos empresários, reduzindo os níveis de investimento, de emprego e crescimento econômico, migrando o equilíbrio entre as curvas de oferta e demanda agregada, ou seja, da economia para um ponto abaixo do pleno emprego. Neste contexto de recessão e desemprego surge o governo, que por meio de políticas econômicas, tais como incremento nos gastos do governo, políticas de exportação e redução na taxa de juros, visa a reduzir estes vazamentos reduzindo a propensão a poupar.
Desta forma, a teoria keynesiana legitima a ação, a intervenção do Estado na economia, com o intuito de alterar as expectativas dos agentes (consumidores e empresários), de forma a conduzi-la para um nível próximo ao pleno emprego. O Estado se utiliza de duas ferramentas a) política fiscal expansionista e b) política monetária expansionista. No primeiro caso, o Estado, se utilizando de uma política fiscal pode a) elevar os gastos do governo; b) elevar os investimentos; e c) realizar política tributária.
No âmbito dos gastos do governo e dos investimentos, o faz mediante financiamento de obras públicas tais como, gastos militares, construção civil, construção de estádios, hospitais, escolas, universidades e por meio da concessão de subsídios, dentre outros. Esta característica provedora do Estado tem como efeito a elevação dos níveis de emprego, dos salários, da renda disponível, do consumo e, por fim, a alteração das expectativas dos empresários, incentivando estes a retomarem seus projetos de investimentos, elevando num ciclo virtuoso os níveis de emprego, que conduzem teoricamente a economia ao nível de pleno emprego.
No âmbito da política monetária o mesmo objetivo é perseguido, ou seja, o de alterar as expectativas dos empresários quanto a retornos futuros. Para tanto, o governo pode reduzir a) as taxas de juros; b) as taxas de redescontos; c) as taxas de desconto compulsório; e, ainda d) comprar títulos em operações de mercado aberto. Esse grupo de medidas possui um efeito expansivo sobre a demanda agregada, uma vez que, ao reduzir as taxas de juros, o governo estimula a propensão a investir e eleva os investimentos. Isto decorre do fato de o empresário, ao comparar os retornos entre investimentos no setor produtivo e aplicações no setor especulativo, verificar a taxa de atratividade, a Eficiência Marginal do Capital (EMK) de um investimento frente às taxas de juros no mercado. E, ao estabelecer qual seria mais lucrativo, ele faz seus desembolsos.
Já as reduções nas taxas de desconto compulsório, de redesconto interbancário e compra de títulos, tendem a elevar o volume de moeda circulando em determinada economia. Com tais políticas, logo com maior quantidade de moeda em circulação, o efeito é o aumento positivo sobre os níveis de consumo, alterando as expectativas de rendimentos dos empresários e, desta forma, concorrendo para a condução da economia ao pleno emprego.
A fundamentação teórica keynesiana fora amplamente utilizada a partir da década de 1930, mais intensamente a partir de 1945, consistindo em fórmula decisiva para escapar à Grande Depressão, gerando crescimento econômico industrial sem precedentes em várias economias. Um caso notável de aplicação da teoria keynesiana fora o Welfare State nos E.U.A., o Estado de bem–estar social onde o governo primou pela concessão de créditos, pelo elevado volume de gastos militares e por intensa industrialização.
Hunt (1987) afirma que, entre 1947 até meados dos anos 70, os gastos militares do governo norte-americano se situaram em torno de US$ 2 trilhões. Estimativas que levam em consideração o efeito do multiplicador de gastos, e, dentre estas, as mais elevadas indicam que em 1947 os gastos militares representaram 30,5% da demanda agregada e em 1971 responderam por 27,8%. No âmbito do endividamento, o desempenho da economia norte-americana depois da guerra é devido a este endividamento, e representou, em relação às famílias, 65% em 1955, variando para 93% em 1974. Já em relação às empresas, o endividamento variou de US$ 400 bilhões em 1946 para US$ 2.500 bilhões em 1974.
Já no Brasil, dadas as suas especificidades, as políticas de caráter keynesiano, primaram pelo elevado volume de gastos do governo na industrialização, principalmente a partir da década de 1950 por meio de vários planos de crescimento industriais, voltados para a indústria de base, setores energéticos, infra-estrutura, automobilística e siderúrgicas, bem como as políticas voltadas para a expansão agrícola, conhecida como revolução verde, por meio de concessões de créditos e subsídios.
Devido aos intensos estímulos à demanda agregada, logo a conseqüente utilização de recursos naturais, conclui-se que o sistema capitalista pode ser tratado como um sistema aberto, em que os pressupostos da teoria keynesiana geram efeitos deletérios sobre o meio, devido à intensa atividade industrial. Em outros termos, devido ao processamento de recursos naturais (fontes de sintropia positiva) e eliminação de externalidades, oriundas da atividade industrial, onde variações nos níveis de investimentos e consumo geram, por seu turno, elevação na extração de recursos naturais, que, decorrentes do processamento destes recursos no interior do sistema capitalista, geram externalidades negativas no meio-ambiente.
A caracterização do sistema capitalista como um sistema aberto ficará evidente no próximo capitulo, onde será apresentada a Teoria das Estruturas Dissipativas enquanto própria para descrever sistemas abertos e dinâmicos, comumente encontrados na natureza. Serão apresentadas também características do sistema capitalista que o fazem possível de ser tratado pela referida teoria para explicar as interações entre sistema econômico e meio-ambiente.

3 TEORIA DAS ESTRUTURAS DISSIPATIVAS

O objetivo do capítulo consiste em apresentar as evoluções feitas no campo da Biologia a partir da década de 1920, que culminaram com a elaboração da Teoria das Estruturas Dissipativas pelo Físico-Químico, prêmio Nobel em Química em 1977, Ilya Prigogine. Apresenta também a referida teoria como própria para descrever sistemas abertos e afastados do equilíbrio, e, ainda, características do capitalismo como passível de ser descrito pela teoria das estruturas dissipativas, por se tratar de um sistema econômico aberto a fluxos de matéria e energia, ou seja, por estar relacionado ao meio-ambiente, aberto à entrada de recursos naturais como forma de manter seu padrão de organização de crescimento econômico ou maximizador de consumo, bem como eliminando externalidades.
De acordo com Capra (1996), surgiu em Viena, na década de 1920, um grupo de biólogos denominado internacionalmente de círculo de Viena que possuiam em comum o fato de acreditarem que os fenômenos biológicos exigiam novas maneiras de pensar, transcendendo os métodos tradicionais das ciências físicas. Dentre estes biólogos, Ludwig von Bertalanffy dedicou-se a substituir os fundamentos mecanicistas da ciência por uma visão sistêmica.
Segundo Capra (1996), Ludwig von Bertalanffy deu um passo fundamental ao reconhecer que os organismos vivos são sistemas abertos que não podem ser descritos pela termodinâmica clássica. Ele chamou esses sistemas de "abertos", porque eles precisam se alimentar de um contínuo fluxo de matéria e energia extraídas do seu meio ambiente para permanecerem vivos.

O organismo não é um sistema estático fechado ao mundo exterior e contendo sempre os componentes idênticos; é um sistema aberto num estado (quase) estacionário ... onde materiais ingressam continuamente vindos do meio ambiente exterior, e neste são deixados materiais provenientes do organismo. Diferentemente dos sistemas fechados, que se estabelecem num estado de equilíbrio térmico, os sistemas abertos se mantêm afastados do equilíbrio, nesse "estado estacionário" caracterizado por fluxo e mudança contínuos. (CAPRA 1996, p. 55)


Segundo Capra (1996), um tratamento mais completo que incorporasse as descobertas de Bertalanffy só seria desenvolvido com o conceito de Estruturas Dissipativas. Trata-se de um modelo da Teoria Geral dos Sistemas Vivos (TGSV), desenvolvido pelo físico-químico Ilya Prigogine, com o objetivo de observar padrões de estabilidade longe do equilíbrio. Quer dizer, diferentes daqueles descritos pela termodinâmica clássica. A teoria das estruturas dissipativas serve para sublinhar a íntima interação que existe entre a estrutura, de um lado, e o fluxo e a mudança ou dissipação, de outro.
Porém Ilya Prigogine se interessou primeiramente pelos fenômenos biológicos. De acordo com Prigogine ( apud Capra, 1996) “eu estava muito interessado no problema da vida. Sempre pensei que a existência da vida está nos dizendo alguma coisa muito importante a respeito da natureza” E ainda segundo Prigogine (1977, p.226) “pareceu-me, então, que aquelas coisas vivas nos proporcionariam notáveis exemplos de sistemas, que eram altamente organizados, em que fenômenos irreversíveis desempenhavam papel essencial.”
De acordo com Prigogine (1977, p.226)

Nossa colaboração era dar à luz um critério de evolução geral que pudesse ser utilizado longe de equilíbrio em ramificações não lineares, fora do domínio de validade do teorema de produção de entropia mínima. Os critérios de estabilidade daí resultantes conduziram à descoberta de estados críticos, de inesperados desdobramentos e no possível aparecimento de novas estruturas. Essa manifestação inesperada dos processos de desordem/ordem, longe do equilíbrio que valida a segunda lei da termodinâmica, constituía a oportunidade de transformar profundamente a interpretação tradicional. Além da estrutura de equilíbrio clássica, para condições longe de equilíbrio suficientes, enfrentávamos agora estruturas dissipativas coerentes.

De acordo com Capra (1996), Estruturas Dissipativas são sistemas comumente encontrados na natureza, que se caracterizam por estarem abertos a fluxos de matéria e energia, quer dizer, apresentam uma entrada (input) e uma saída (output). Por estarem afastados do equilíbrio entende-se que são sistemas fluentes, dinâmicos. De acordo com Maturana e Garcia (1997), se caracterizam desta forma por uma derivação estrutural, significando que, por estarem em constante interação com seu ambiente, ou abertos a fluxos de matéria e energia, os sistemas possuem laços de retro-alimentação. Ou seja, mudanças estruturais no sistema causam mudanças estruturais em seu ambiente, que, por sua vez, afetará o sistema. Sendo assim, o conceito de derivação estrutural pressupõe que exista uma interdependência dinâmica entre sistema e ambiente, de tal forma que, para o sistema manter seu padrão de organização estável, dependerá do fluxo de matéria e energia oriundas de seu ambiente a percorrer todo o sistema, de forma que, interrompido esse fluxo, o sistema tende a desintegrar-se.

Estruturas dissipativas são ilhas de ordem num mar de desordem, mantendo e até mesmo aumentando sua ordem às expensas da desordem maior em seus ambientes. Por exemplo, organismos vivos extraem estruturas ordenadas (alimentos) de seu meio ambiente, usam-nas como recursos para o seu metabolismo, e dissipam estruturas de ordem mais baixa (resíduos). Dessa maneira, a ordem "flutua na desordem", (...) embora a entropia global continue aumentando (PRIGOGINE apud CAPRA, 1996, p.151 )


Enfim, a teoria das estruturas dissipativas serve para descrever sistemas que: a) estão abertos a fluxos de matéria e energia, portanto utilizando-se de fontes de sintropias positivas e, por outro lado, gerando elevada entropia. Em outros termos, captam recursos do ambiente e eliminam externalidades, resíduos; b) apresentam um padrão de organização emergente a partir de um ponto crítico. Para Prigogine (1977), é também estável; a mesma estrutura global se conserva, apesar do fluxo e da mudança constantes dos seus componentes. Uma estrutura dissipativa é caracterizada por Paiva (2001, p.7) como “um processo de auto-organização que se desenvolve no não-equilíbrio que freqüentemente resulta em uma estrutura que apresenta uma forma muito mais complexa de comportamento. Sua característica distintiva é que ela requer uma entrada contínua de energia para ser sustentada”. Este processo é demonstrado por Capra (2002, p.88) através de um caso clássico de auto-organização, a instabilidade de Bénard.

Prigogine (...) se voltou para o fenômeno (...) da convecção, do calor, conhecido como "instabilidade de Bénard", que é hoje considerado como um caso clássico de auto-organização. No começo do século, o físico francês Henri Bénard descobriu que o aquecimento de uma fina camada de líquido pode resultar em estruturas estranhamente ordenadas. Quando o líquido é uniformemente aquecido a partir de baixo, é estabelecido um fluxo térmico constante que se move do fundo para o topo. O próprio líquido permanece em repouso, e o calor é transferido apenas por condução. No entanto, quando a diferença de temperatura entre as superfícies do topo e do fundo atinge um certo valor crítico, o fluxo térmico é substituído pela convecção térmica, na qual o calor é transferido pelo movimento coerente de um grande número de moléculas. A essa altura, emerge um extraordinário padrão ordenado de células hexagonais ("favo de mel"), no qual o líquido aquecido sobe através dos centros das células, enquanto o líquido mais frio desce para o fundo ao longo das paredes das células.

De acordo com Capra (1996) a análise dessas "célul

as de Bénard" mostrou que, “à medida que o sistema se afasta do equilíbrio (isto é, a partir de um estado com temperatura uniforme ao longo de todo o líquido), ele atinge um ponto crítico de instabilidade, no qual emerge o padrão hexagonal ordenado”.
De acordo com Capra (1996, p.89), “Prigogine e seus colaboradores descobriram que, como no caso da convecção de Bénard, esse comportamento coerente emerge de maneira espontânea em pontos críticos de instabilidade afastados do equilíbrio”.
Não apenas o caso da instabilidade de Bénard, mas, de acordo com Paiva (2001, p.1), a maioria dos fenômenos encontrados na natureza e até mesmo no comportamento humano podem ser descritos pela teoria das estruturas dissipativas, por apresentarem, de um lado, ordem e estabilidade e, de outro, a desordem e a irregularidade. Exemplos de tais fenômenos seriam as mudanças no clima, redemoinhos de vento ou redemoinhos em geral, movimentos irregulares em taxas de lucros, em preços de ações e no dólar.
Ademais, Paiva (2001) cita uma empresa como exemplo de uma estrutura dissipativa, pois, resumidamente, uma empresa é um sistema que recebe entradas, tais como matérias-primas, mão-de-obra, pedidos e transforma estas entradas em saídas, que são o produto acabado, os lucros, salários, serviços. Uma empresa está em constante interação com seu ambiente, de forma que o resultado de um período alimenta o período posterior.
Um outro exemplo citado por Capra (1996) de uma estrutura dissipativa seria a célula, pois se encontra aberta a fluxos de materiais do ambiente e elimina resíduos. Ademais, uma célula apresenta um padrão emergente que é sua própria organização, ou seja, uma célula está aberta a fluxos de materiais através de interações recorrentes com o ambiente a fim de manter seu padrão emergente, que é sua organização. Outros casos poderiam ser citados como exemplos de estruturas dissipativas, que são os organismos vivos, sub-sistemas e outros sistemas sociais.

As estruturas dissipativas formadas por redemoinhos de água ou por furacões só poderão manter sua estabilidade enquanto houver um fluxo estacionário de matéria, vindo do meio ambiente, através da estrutura. De maneira semelhante, uma estrutura dissipativa viva, como, por exemplo, um organismo, necessita de um fluxo contínuo de ar, de água e de alimento vindo do meio ambiente através do sistema para permanecer vivo e manter sua ordem. (CAPRA, 1996, p.134).


Uma estrutura dissipativa se constitui em dois momentos. O primeiro momento é linear e corresponde à segunda lei da termodinâmica, onde os escoamentos são mínimos. O segundo é não-linear; o processo se torna irreversível e só pode ser descrito pela termodinâmica de sistemas irreversíveis.
O primeiro momento, segundo Capra (1996), se caracteriza por estar próximo ao equilíbrio. Neste estágio há processos de fluxos, de escoamentos, porém fracos. Neste caso o sistema será conduzido a um estado de entropia mínima, minimizando seus escoamentos, permanecendo tão perto quanto possível do equilíbrio.
A figura 01 trata da representação de uma estrutura dissipativa. Num primeiro momento, apresenta um padrão linear. No entanto, a partir de um ponto crítico, apresenta um padrão caótico, não-linear, e passa a um novo estado de ordem.

Figura 01 – Representação Gráfica – Estrutura Dissipativa




Fonte: Adaptado de CERQUEIRA (2000, p.17)

O sistema se afasta do equilíbrio ao aumentarem gradativamente os fluxos de matéria e energia. Neste estágio, os escoamentos são mais fortes, a entropia se eleva e o sistema não tende mais ao equilíbrio. Encontra instabilidades que o levam a novas formas de ordem e afastam o sistema cada vez mais do equilíbrio. A complexidade é crescente e o conduz ao segundo momento.
Segundo Capra (2006), o segundo momento, é caracterizado como não-linear, de modo que, à partir de um ponto crítico, o sistema passa a se comportar como um todo, tornando impossível integrar o sistema a partir de suas partes. Neste ponto de passagem de equilíbrio para o não-equilíbrio emerge espontaneamente um padrão ordenado.
De acordo com Capra (2002, p.22),

Quando o fluxo de energia aumenta, o sistema pode chegar a um ponto de instabilidade, chamado de “ponto de bifurcação”, no qual tem a possibilidade de derivar para um estado totalmente novo, em que podem surgir novas estruturas e novas formas de ordem. Esse surgimento espontâneo da ordem nos pontos críticos de instabilidade é um dos conceitos mais importantes da nova compreensão da vida. Tecnicamente, denomina-se “auto-organização”, e, em língua inglesa, é muitas vezes chamado simplesmente de emmergence, (...) ou surgimento.
Segundo Capra (1996), a principal característica observada é a ocorrência do fenômeno emmergence, que é definido como o surgimento de comportamentos coerentes e espontâneos, afastados do equilíbrio, sendo esta uma idéia auto-organizativa caracterizada, pelo surgimento espontâneo de novas formas de ordem.
Sendo assim, de acordo com Capra (1996), as estruturas dissipativas, além de se manterem longe do equilíbrio, podem até mesmo apresentar saltos de inovação. A criatividade, a inovação, o surgimento aparece quando é aumentado o fluxo de energia e matéria através da estrutura, podendo passar por novas instabilidades e se transformar em novas estruturas de complexidade crescente.
De acordo com Capra (2002), a partir do ponto crítico, cumpre um papel importante o conceito de laços catalíticos, laços de retro-alimentação e ainda laços de amplificação. São estes laços que farão o sistema se comportar como um todo e emergir para uma nova forma de organização. Embora as estruturas dissipativas recebam sua energia do exterior, as instabilidades e os saltos para novas formas de organização são os resultados de flutuações amplificadas por laços de retro alimentação positivos. Desse modo, a amplificação da realimentação que gera um "aumento disparado", aparece como uma fonte de nova ordem e complexidade na teoria das estruturas dissipativas.
De acordo com Capra (1996), conclui-se que uma perturbação não estará limitada a um único efeito, mas tem possibilidade de se transformar em formas cada vez mais amplas. Ela pode até mesmo ser amplificada por laços de realimentação interdependentes, capazes de obscurecer a fonte original da perturbação. Sendo assim, a partir do ponto crítico, o sistema perde sua previsibilidade, sua reversibilidade e apresenta vários caminhos. A trajetória que o sistema seguirá a partir do ponto crítico dependerá das condições iniciais, de sua história.
Segundo Capra (1996), a partir do ponto crítico surge um elemento de indeterminação na teoria. Não há possibilidade de previsão a não ser em espaços muito curtos de tempo. Torna-se impossível saber qual trajetória o sistema seguirá a partir do ponto crítico, pois, a partir deste, se torna altamente não linear devido a laços de retro-alimentação, onde são gerados vários caminhos que dependem das condições iniciais, da história do sistema. Torna-se, então, imprevisível, ou seja, oscilações mínimas no ambiente determinarão qual trajetória seguir.

3.1 O Sistema Capitalista

Não apenas os organismos vivos, mas sistemas sociais e sub-sistemas sociais podem ser descritos pela teoria das estruturas dissipativas. No caso, uma economia capitalista possui características próprias a serem descritas pela referida teoria, sendo a primeira o fato de estar aberta a um contínuo fluxo de matéria e energia oriundos de fontes de sintropia positiva como meio de manter seu padrão de organização. Quer dizer, uma economia capitalista para manter seus processos de produção, consumo e geração de lucros recorre ao meio ambiente de onde são extraídos os recursos e energia para efetuá-los, significando que possui uma entrada e uma saída.
A segunda característica decorrente do fato de estar aberta aos fluxos de matéria e energia, significa que elimina resíduos destes recursos processados, elimina dejetos, externalidades negativas em seu ambiente, concorrendo para elevar a entropia, a desordem, enfim possui uma saída. Em seu interior, apresenta um padrão de organização, seja ele de maximização de consumo, investimento ou de crescimento econômico, que é o próprio padrão de organização das economias capitalistas, onde uma parte dos recursos captados é deixada dentro do sistema.
Desta forma, as alterações no interior do sistema capitalista, mais precisamente alterações em seus processos de consumo e produção, geram, consequentemente, alterações na estrutura do meio-ambiente, devido à existência de uma interdependência dinâmica entre sistema e meio-ambiente. Essa interdependência pode ser claramente visualizada por meio do conceito de derivação, ou acoplamento estrutural, onde,

Dado o determinismo estrutural, uma vez que um sistema surge, seu acontecer consiste necessariamente numa história de interações recorrentes com os elementos de um meio que surgem com ele e o contém. Além disso, tal história de interações recorrentes entre o sistema e o meio transcorre necessariamente como uma derivação estrutural. Isto é, tanto a estrutura do sistema quanto à estrutura do meio mudam necessariamente e de maneira espontânea de um modo congruente e complementar enquanto o sistema conserva sua organização e coerência operacional com o meio que lhe permite conservar sua organização. Isso acontece numa dinâmica de complementariedade operacional na qual um observador vê o sistema deslocar-se no meio seguindo o único curso que pode seguir na conservação de sua organização, num processo no qual as estruturas do sistema e do meio mudam conjuntamente de maneira congruente até que o sistema se desintegra. (MATURANA E GARCIA, 1997, p. 30)


De tal forma que, à medida que se intensifica o fluxo de matéria e energia no interior do sistema, ocorre o surgimento de novos padrões de consumo. A ordem dentro do sistema, a manutenção da organização ocorre mediante a substituição de baixa entropia na natureza pela emergência de desordem, de elevada entropia.
Se a Teoria das Estruturas Dissipativas trata de fenômenos distantes do equilíbrio, apresentando o surgimento de ordem em meio à desordem, esta pode servir para descrever sistemas econômicos, bem como o sistema capitalista como apresentando ordem (crescimento econômico, novos níveis de consumo) em meio à desordem crescente (impactos ecológicos).
Os impactos ecológicos gerados pela atividade econômica são mais facilmente compreendidos ao visualizar o Sistema Capitalista como um sistema aberto. Na próxima seção, a Teoria das Estruturas Dissipativas será acoplada aos princípios da teoria keynesiana com o objetivo de demonstrar como a intensificação nos processos de consumo e investimento alteram a estrutura do meio, gerando impactos ecológicos. E, por sua vez, como tais impactos provocam alterações no sistema econômico, gerando uma economia com tendências inflacionárias e aumentos pela demanda por bens públicos. Nestes termos, a política econômica funciona como um determinismo estrutural enquanto processo que define e redefine a estrutura do sistema capitalista como deletéria, o que, por sua vez, determina, de forma congruente e complementar, a estrutura do meio, alterando-a.

4 TEORIA DAS ESTRUTURAS DISSIPATIVAS ACOPLADA A TEORIA KEYNESIANA



O objetivo do capítulo consiste em apresentar, mediante a Teoria das Estruturas Dissipativas, como o aumento nos volumes de investimento e consumo, estimulados por meio de políticas econômicas expansionistas, altera a estrutura do meio e intensifica os impactos ecológicos.
A dinâmica ocorre e pode ser visualizada por meio da Figura 02, onde, ao tentar manter o padrão de organização do sistema capitalista de elevado consumo, o Governo se utiliza de políticas que levem a esse objetivo, ou seja, de políticas fiscais e monetárias expansionistas. Isto concorre para elevar investimentos e consumo, bem como a captação de recursos naturais e o volume de emissões, de externalidades negativas, de dejetos fora do sistema, no meio-ambiente. Neste caso, cumprem um papel importante variáveis que impactam sobre o meio, políticas de estímulo a demanda agregada, que induzem a aumentos das exportações e aumentos nos investimentos, mantendo, estimulando a extração de recursos naturais e a geração de externalidades negativas.






Figura 02 - DINÂMICA ENTRE SISTEMA ECONÔMICO E MEIO – AMBIENTE – FLUXOGRAMA






Fonte: Elaboração própria

Para elevar o volume de investimentos por meio de uma política fiscal e monetária expansionista, o governo manipula variáveis econômicas tais como, redução na taxa de juros, aumento nos gastos governamentais, redução tarifária, aumento da carga tributária, com intuito de financiar os investimentos estatais, políticas de incentivo à exportação, concessão de créditos, dentre outros. Desta forma, ao exercer política fiscal expansionista, o governo eleva ou cria condições para os aumentos na produção e, por conseguinte, mantém o padrão de organização do sistema capitalista. E, como este ocorre de forma interdependente, complementar e congruente ao meio, eleva a extração de recursos naturais, senão de fontes de sintropia positiva, e aumenta em seu meio-ambiente a desordem, ou seja, o grau de entropia por meio de externalidades negativas.
De outro modo, gera impactos no meio-ambiente por meio de política monetária expansionista ao manipular variáveis tais como, redução na taxa de juros, redução na taxa de redesconto ou comprando títulos. Agindo assim, eleva a Eficiência Marginal do Capital (EMK) frente às taxas de juros no mercado, alterando as expectativas de retorno dos agentes, dos empresários. Isto provoca maior inversão de investimentos, que, por sua vez, tende a elevar a utilização de recursos naturais e a emissão de externalidades.
Logo, ao aplicar uma política econômica de cunho keynesiana com o intuito de conduzir a economia ao nível de pleno emprego, há intensificações no fluxo de matéria e energia circulando dentro do sistema econômico, maior utilização de fontes de sintropia positiva e maior volume de emissões de poluentes.
De acordo com o conceito de derivação estrutural ou acoplamento estrutural[1] levantado por Maturana e Garcia (1997), alterações no sistema capitalista geram alterações estruturais no meio ambiente, que, por sua vez, decorrentes das alterações no meio-ambiente, geram alterações no sistema econômico. Este fenômeno ocorre devido a relações recorrentes entre sistema capitalista e meio, por aquele ser dependente deste para manter seu padrão de organização. Alterações nos processos de consumo e produção geram alterações no meio-ambiente devido a intensificação na utilização de recursos, gerando impactos ecológicos. Tais impactos se dão sobre o sistema econômico na forma de uma economia com tendências inflacionárias e com aumentos na demanda por bens públicos, geradas por redução na qualidade de alimentos, endemias, etc.
De acordo com o gráfico 02, para cada nível de produto ou para cada ponto de equilíbrio entre as curvas de demanda agregada e oferta agregada há um nível correspondente de externalidades, de tal forma que os níveis de externalidades são elevados toda vez que o crescimento econômico é expandido. Sendo assim, conclui-se que a busca pelo pleno emprego dos fatores de produção intensifica ou eleva as externalidades negativas ou impactos ecológicos.


Gráfico 02 - Interdependência Dinâmica Entre Sistema Econômico e Meio

Fonte: Elaboração Própria. Adaptado de Dornbusch e Fischer; CERQUEIRA UFMG (2000, p.17)

Mediante a teoria das estruturas dissipativas, num primeiro momento, representado pelo intervalo que vai de E1 a E2, tais impactos seriam minimizados pela capacidade de auto-organização do meio. Este primeiro momento é considerado como um estado de entropia mínima e neste estágio a capacidade de auto-organização do meio-ambiente ocorre proporcionalmente às variações nos níveis de externalidades, em conformidade com o fluxo de matéria e energia processado no interior do sistema econômico, bem como de emissões. Ou seja, o meio processa as externalidades emitidas pela expansão da economia de tal forma que o dano é mínimo.
Entretanto, a busca contínua pelo pleno emprego dos fatores de produção, representada nos gráficos 02 pelas variações no produto de Y1 para Y2 tende a conduzir as externalidades geradas pelo sistema a um ponto crítico (Z)[1]. A partir deste segundo momento, devido a laços de retro-alimentação, tais externalidades se tornariam auto-produtoras. Quer dizer que, estas passariam a autogerar-se, não apenas em função da atividade industrial, mas inclusive, das externalidades de um período anterior. Neste estágio, a partir do ponto crítico onde os níveis de investimentos igualariam e posteriormente se fariam maiores que a capacidade de auto-organização da terra, conduziria as interações entre sistema e meio a uma nova forma de organização, passando de um estágio de entropia mínima para um estágio de elevada desordem.
Em outros termos, neste estágio com o multiplicador de gastos keynesiano (k) e uma variação nos níveis de investimentos (AI) poderá ocorrer um volume (1+x) de externalidades. Isso se torna possível devido aos laços de amplificação que é característica de toda estrutura dissipativa, de todo sistema aberto encontrado na natureza. Não é possível definir o novo nível de externalidades, pois, a partir do ponto crítico (Z), devido aos laços de amplificação e retro-alimentação, o sistema se torna altamente não-linear, impossibilitando qualquer previsão que não seja num curto espaço de tempo.
Ademais, o processo é irreversível, significando que, mesmo mantendo os níveis de investimentos estáveis, os laços de amplificação não se estabilizarão. Neste sentido, os efeitos entrópicos da atividade econômica num determinado momento (t) dependerão das ações, das atividades ocorridas num período anterior (t-1), da história do sistema e das condições iniciais.
Sendo assim, conclui-se que as ciências econômicas, ao terem em suas bases modelos de crescimento econômico centrados na ênfase conferida a aumentos de investimentos e consumo, terão uma tendência de impactar de forma deletéria sobre os ecossistemas. Esta mudança estrutural no meio ambiente, devido a alterações nos processos econômicos, gera, de forma retroativa e reiterada, um feixe de impactos no sistema econômico, tais como aumento na demanda por bens públicos, inflação de custos.
No próximo capítulo será apresentada a teoria elaborada por Maturana e Garcia (1997) denominada Autopoiese. De acordo com Capra (1982) Autopoiesis trata-se de um helenismo, onde “auto”, significa “si mesmo” e “poiesis” significa produção, sendo assim autopoiese significa autoprodução ou autocriação. Suas características são as de apresentar um processo circular fechado, é tida como uma rede de componentes que se autoproduz. Seus componentes são autônomos e produzem a si mesmos, produzindo desta forma toda a rede, todo o sistema. E como se trata de um processo de causação circular, seus componentes são produtos. Desta forma, sistemas autopoiéticos são aqueles que possuem a capacidade de construírem a si próprios e a esta classe de sistemas pertencem os seres vivos.
Entretanto não será objeto do próximo capítulo um tratamento detido a respeito da Autopoiese, em toda sua complexidade. Mas somente apresentar ou salientar características relacionadas a Autopoiese que sirvam como referencial ao conceito de sustentabilidade no âmbito das ciências econômicas, ou ainda como referencial ao tratamento de sustentabilidade no sistema capitalista. Sendo assim, ficam eliminados o tratamento referentes à materializações da Autopoiese, diversidade da Autopoiese (reprodução, evolução, implicações gnoseológicas), etc.

[1] Segundo Capra (1996) matematicamente, um ponto crítico representa uma dramática mudança da trajetória do sistema no espaço de fase. Um novo atrator pode aparecer subitamente, de modo que o comportamento do sistema como um todo "se bifurca", ou se ramifica, numa nova direção. Ao tratar das mudanças climáticas para o Greenpeace (2007), o ponto crítico se situaria a um aquecimento de 2º C aos níveis pré-industriais.

5 TEORIA DA AUTOPOIESE

SEGUNDA PARTE
O DESENHO DA AVICENNIA ÀS ECONOMIAS NACIONAIS
Maturana e Garcia (1997) apresentam a dificuldade que se estabeleceu desde os primórdios da Biologia em tratar da autonomia dos seres vivos. E afirmam ainda, que este fora o principal problema posto aos homens. No entanto, observar o fenômeno biológico como um todo, de forma sistêmica tem sido um problema rejeitado por grande parte dos cientistas. Neste contexto partem então, de um problema, a saber, descobrir o que possui comum a todos os seres vivos que possa permitir qualificá-los como tais. Desta forma, seu objetivo geral consiste em indicar a natureza da organização dos sistemas vivos em relação a seu caráter de unidade.
Maturana e Garcia (1997) no âmbito metodológico alertam que apesar de usarem recursos mecanicistas seu enfoque é sistêmico, o que vale dizer, que estes não tratam das propriedades dos elementos, de sua constituição básica, mas sim de relações, de processos, de relações entre processos e de leis que regulam estes processos, realizados pelos componentes. Possuem como hipótese de estudo a existência de uma organização comum a todos os seres vivos, de tal forma que quando começa a vida o que começa é esta organização, explicando estes, os seres vivos, em termos de uma organização, de relações entre componentes. Sendo assim, para tratarem desta organização comum a todos os sistemas vivos partem do conceito de máquinas, diferenciando estas entre alopoiéticas e autopoiéticas, onde máquinas “são consideradas comumente como sistemas materiais definidos pela natureza de seus componentes e pelo objetivo que cumprem em seu operar como artefatos de fabricação humana” (MATURANA E GARCIA, 1997, p. 69)
Máquinas são unidades e “são formadas de componentes caracterizados por determinadas propriedades capazes de satisfazer determinadas relações que determinam na unidade as interações e transformações desses mesmos componentes” (MATURANA E GARCIA, 1997, p. 69). De tal forma que, a natureza concreta dos componentes não interessa, bem como as propriedades dos componentes, exceto aquelas propriedades que interferem no conjunto de interações e transformações dentro do sistema.
As máquinas que o homem fabrica possuem um objetivo prático ou não, especificado pelo próprio homem, já a respeito das máquinas viventes Maturana e Garcia (1997) as classifica entre máquinas autopoiéticas e sistemas viventes. Desta forma, para os autores os organismos vivos são vistos como uma máquina.
A respeito das máquinas autopoiéticas Maturana e Garcia (1997) as difere de um sistema aberto. As principais características destas máquinas se configuram por serem autopoiéticas, onde estas mantêm suas variáveis constantes dentro de um limite de valores, o processo ocorre dentro de um intervalo de limites que a própria organização do sistema especifica, quer dizer não são especificadas pelo homem. Sendo assim, são homeostáticos, toda retro-alimentação ocorre no interior a elas, desta forma não recorrem ao meio para manter sua organização.
Maturana e Garcia (1997, p.71) definem as máquinas autopoiéticas como:

Uma máquina organizada como um sistema de processos de produção de componentes concatenados de tal maneira que produzem componentes que: I) geram os processos (relações) de produção que os produzem através de suas contínuas interações e transformações, e II) constituem à máquina como uma unidade no espaço físico. Por conseguinte, uma máquina autopoiética continuamente especifica e produz sua própria organização através da produção de seus componentes, sob condições de contínua perturbação e compensação dessas perturbações (produção de componentes).

Máquinas autopoiéticas se caracterizam por serem homeostáticas, especificam e produzem sua própria organização, através da produção de seus componentes. Segundo Maturana e Garcia (1997, p. 71) “uma máquina autopoiética é um sistema homeostático que tem sua própria organização como variável que mantêm constante.” E ainda, de acordo com Maturana e Garcia (1997, p.71) “para que uma máquina seja autopoiética é necessário que as relações de produção que a definem sejam continuamente regeradas pelos componentes que produzem”. Sendo assim os componentes devem estar concatenados para serem tidos como uma máquina, devendo existir uma relação de produção de componentes, senão uma concatenação de processos, onde a concatenação autopoiética de processos numa unidade fisica diferencia as máquinas autopoiéticas de outro tipo de máquinas (alopoiéticas), de tal forma que as máquinas criadas pelo homem possuem processos, mas não processos de produção de componentes, sendo denominadas sistemas dinâmicos não-autopoiéticos, alopoiéticos, enfim.
As diferenças entre máquinas alopoiéticas e autopoiéticas residem no fato de naquelas as relações ocorrem entre componentes, de ocorrerem processos; ao passo que nas máquinas autopoiéticas ocorram relações de produção de componentes e concatenação de processos que são autoprodutores. Neste sentido, Maturana e Garcia (1997, p. 72) definem autopoiese como:

Processos concatenados de uma maneira especifica tal que os processos concatenados produzem os componentes que constituem o sistema e especificam como uma unidade. É por esta razão que podemos dizer que, cada vez que tal organização se concretiza num sistema real, o domínio de deformações que este sistema pode compensar sem perder sua identidade ocorre em um domínio de trocas no qual o sistema, enquanto existe, mantém constante sua organização. É adequado condensar esta descrição dizendo que os sistemas autopoiéticos são sistemas homeostáticos que possuem sua própria organização como a variável mantida constante.


A respeito da Autopoiese Capra vai dizer (1996, p. 99) que

Tendo esclarecido que seu interesse é com a organização, e não com a estrutura, os autores prosseguem então definindo autopoiese, a organização comum a todos os sistemas vivos. Trata-se de uma rede de processos de produção, nos quais a função de cada componente consiste em participar da produção ou da transformação de outros componentes da rede. Desse modo, toda a rede, continuamente, "produz a si mesma". Ela é produzida pelos seus componentes e, por sua vez, produz esses componentes.

E a partir desta definição Maturana e Garcia (1997, p. 72) concluem que: a) sistemas autopoiéticos são autônomos; b) por serem autônomos não podem ser considerados alopoiéticos. Caracterizam-se ainda, por possuírem individualidade, por não possuírem entradas e nem saídas, onde “uma organização pode permanecer constante sendo estática, ou mantendo constante seus componentes, ou também mantendo constantes as relações entre componentes que por outra parte estão em contínuo fluxo e mudança” (MATURANA E GARCIA, 1997, p.74)
Em relação aos sistemas autopoiéticos ou viventes estes, segundo Maturana e Garcia (1997, p. 75) “transformam a matéria neles mesmos de forma que seu produto é sua própria organização”. Para Maturana e Garcia (1997, p. 75) “se um sistema é autopoiético, é vivente.” E ainda, segundo Maturana e Garcia (1997, p. 75) “ a noção de autopoiese é necessária e suficiente para caracterizar a organização dos sistemas vivos”
Para Maturana e Garcia (1997) não é possível criar ou desenhar um sistema vivo por: serem autônomos, impredizíveis, por serem demasiado complexos, por derivar de princípios que ainda não conhecemos, ou por serem estes princípios totalmente incognoscíveis.
Concluindo, autopoiese trata-se do padrão de organização comum a todos os sistemas vivos e se caracteriza-se por: a) uma rede, pela interligação em rede de seus componentes; b) esta rede tem como objetivo criar a si mesma, onde um componente cria a si mesmo determinando toda a rede. Desta forma a rede de componentes é auto-criadora, auto-geradora; c) os componentes estão interligados por laços retroalimentadores. d) da mesma forma, autoreguladora, as variáveis, ou os componentes oscilam dentro de um limite, diz-se que se trata de uma rede homeostática. e) não recorre ao meio para manter sua organização, não se caracteriza, então por ser alopoiética; f) a rede é cooperativa (cooperação); g) tanto maior o número de componentes maior sua flexibilidade, maior seu poder de auto-criação; h) por não ser alopoiética diz-se que se trata de uma rede onde a reciclagem é sua característica principal, isto quer dizer que a rede não elimina dejetos ou capta recursos ao meio. A energia e a matéria circulam indefinidamente no interior do sistema, de tal forma que o volume de resíduos é mínimo, igual a zero. Exemplos de sistemas autopoiéticos podem ser citados, como o sistema nervoso, ao passo que um ecossistema pode oferecer uma noção intuitiva de Autopoiese facilmente possível de ser apreendida. Para tratar da Autopoiese Maturana e Garcia (1997) apresentam o sistema nervoso como tal.

5.1 CARACTERÍSTICAS AUTOPOIÉTICAS DA AVICENNIA


Segundo ( ) a Avicennia schaueriana trata-se de uma planta da família das acanthaceas . Típica dos manguezais e mais conhecida pelo nome de Siriúba. Aparece em todo o mundo, mais especificamente ao longo do litoral brasileiro, da região Sudeste até à região Sul do Brasil, incluindo o Estado e a cidade do Rio de Janeiro.
As raízes desta planta crescem sobre o solo, facilitando seu processo de respiração, possuindo ainda, certos grúmulos de onde é expelido o excesso de sal da água do mar. Ademais, como todas as plantas, possui características autopoiéticas notáveis que a torna possível ser tratada como perfeito referencial ao conceito de sustentabilidade, uma vez que, o relacionamento entre planta e meio ocorre de maneira harmônica, sem gerar nenhum dano.
Dentre as características citamos o fato de:
a) Está fechada organizacionalmente ao seu meio, onde planta e meio se constituem em um único sistema, um ecossistema (Mangue);
b) Reciclar os dejetos
Apesar de captar nutrientes do meio que a circunda, nenhum destes são transformados em lixo, resíduo. De tal modo que, os dejetos da Avicennia são aproveitados pelo ecossistema, onde impera o princípio da reciclagem. Por exemplo, as folhas da árvore que caem ao solo são decompostas e utilizadas como alimento por outros seres, decompostas em nutrientes, enriquecendo o solo. Tais nutrientes, posteriormente são reaproveitados pela própria Avicennia e por outras árvores do ecossistema. Poderíamos citar ainda como exemplo, o oxigênio emitido pela Avicennia, que é utilizado pelos animais; De outro modo, as emissões de gás carbônico emitidas pelos animais e pela decomposição de materiais orgânicos são utilizados pela Avicennia em seus processos de fotossíntese, onde o carbono oriundo dos processos de fotossíntese processados pela Avicennia possuem como fonte, a energia solar, que por sua vez, estas quantidades de carbono serão transformados e alojados no caule da planta como reserva de energia solar.
c) Recompor componentes desgastados

Sendo assim, por meio do processo de fotossíntese e reciclagem, a Avicennia recompõe o próprio ambiente, ou seja, o ecossistema ao qual pertence.
Ademais, pelo princípio da reciclagem e das relações recorrentes entre meio e planta, esta especifica os próprios limites, ou seja, o único produto que gera é sua estabilidade, sua permanência no tempo e no espaço. Portanto, enquanto em seu acontecer, a Avicennia se ocupa, unicamente em criar as próprias condições de sua própria sobrevivência, ela recria seu ecossistema numa relação harmoniosa, de parceria e cooperação. Isto é Auto-criação, auto-produção, autopoiese, senão sustentabilidade.
Logo, de acordo com o exposto acima, a relação da Avicennia com seu ambiente pode ser vista como autopoiética, auto-sustentável. E não apenas isto, podemos visualizar a Avicennia como um modelo perfeito de sustentabilidade.
Tais processos observados na natureza são processos circulares em rede e são autoprodutores, não há ai o fenômeno competição e tampouco o desperdício. A competição pode neste caso ser encarada como uma singularidade num processo maior de cooperação. E é por meio destes que um ecossistema, qualquer ecossistema mantem sua estabilidade, sua autocriação sem recorrer ao meio. Ou seja, a Avicennia ao demandar materiais e energia de seu meio, não elimina dejetos ou resíduos. A avicennia é auto-sustentável por meio da flexibilidade, da diversidade e da parceria entre seus componentes, e ainda, pela constante reciclagem de materiais e energia numa intricada teia de relações não-lineares.
As relações entre o ecossistema e a Avicennia, desta forma se estrutura no formato de rede, onde um componente determina o todo que, por sua vez, é determinado pelo todo. Enfim, cada componente é resultado e causa ao mesmo tempo, cada componente é produto e produtor ao mesmo tempo. Nestes termos a configuração de um ecossistema pode ser vista como autopoiética.
Os sistemas sociais, de outro modo são vistos como alopoiéticos, pois necessitam constantemente recorrer ao meio para manter seu padrão de organização. De tal forma que para obter a sustentabilidade o desafio que se propõe é dotar os sistemas sociais, empresas, setores, dentre outros de uma configuração similar à da Avicennia, portanto, sustentável, senão autopoiética.
Ao olharmos para a vida, mais detidamente para a Avicennia e para seu modo de se relacionar com o meio, ou seja, para o seu padrão de organização, poderíamos tirar lições, desenhos, figurinos e princípios importantes e aplicá-los à nossa sociedade, aos nossos sistemas econômicos, tramando assim para o reencantamento da episteme, das ciências, do cientista e do mundo. Portanto, é nossa intenção aqui olhar para a vida e, à partir daí, apresentar algumas destas lições, destes desenhos propostos pela Avicennia aos sistemas sociais.

6 DESIGN DA AVICENNIA PARA AS ECONOMIAS NACIONAIS

Considerando o sistema capitalista como uma máquina de dinâmica não-autopoiética, o capítulo tem como objetivo aplicar alguns princípios e características autopoiéticas da Avicennia ao sistema capitalista, bem como apresentar um conceito ideal de sustentabilidade.
Uma economia keynesiana pode ser tratada como uma rede, onde famílias, governo, empresas e resto do mundo estão interrelacionados de tal forma que, um componente produz outro, porém não como uma rede autopoiética, mas na forma de um sistema alopoiético onde:
a) os componentes estão interrelacionados em rede;
b) a manutenção desta rede ocorre em função do meio, quer dizer, os níveis de consumo, gastos do governo, produção e exportação ocorrem em função da utilização de recursos naturais;
c) o objetivo da rede é a geração do lucro, senão da valorização constante do capital, portanto trata-se de uma máquina de dinâmica não autopoiética que gera um produto que não é ela mesma, quer dizer seus limites são especificados pelo homem;
d) os componentes estão ligados por laços retroalimentadores;
e) não é homeostática, o que vale dizer que o sistema não contorna suas deformações, mas o caráter maximizante do crescimento econômico enquanto meio de se alcançar o bem-estar tende a estrangular o meio. É fluente, onde algumas variáveis são maximizadas tais como, crescimento econômico, consumo, exportações ou investimentos, ou seja, não situa dentro de certos limites, tendendo a extrapolar estes mesmos limites, estrangulando o Sistema de Gaia (stress) e,
f) Apresenta uma característica que o faz radicalmente diferente dos sistemas vivos, a saber, o fato de não reciclar os próprios resíduos.
Considerando que, ao intensificar os processos no sistema capitalista, sejam estes de acumulação, investimento, produção ou consumo, será definida ou determinada uma estrutura deletéria, ou seja, que por sua vez afetará os processos no sistema de Gaia, redefinindo a estrutura deste. As soluções únicas que amenizem tais impactos haverão de ser soluções sustentáveis, que garantam a estabilidade e a capacidade de auto-organização do Sistema de Gaia.
Tais soluções para que sejam tidas como sustentáveis devem alterar os processos, revertendo estes de deletérios para não-deletérios, de baixa entropia e assim redefinindo a estrutura do sistema econômico para que este ao gerar impactos ecológicos sobre o meio, ocorra de forma mínima.
Tais soluções podem ser referenciadas a partir do modelo apontado por Maturana e Varela (1997) denominado autopoiesis, logo pelo comportamento da Avicennia com seu meio. Ao migrar os princípios da Avicennia para as ciências econômicas é obtido um conceito ideal de sustentabilidade ou um conceito de sustentabilidade perfeita. As condições deste conceito são tais que o sistema capitalista deve:

a) Estar fechado organizacionalmente aos fluxos de matéria e energia, isso quer dizer que, o sistema não deve recorrer ao meio, ao sistema de Gaia para manter seu padrão de organização, desta forma o sistema não capta recursos ao sistema de Gaia e não elimina externalidades negativas. Para que tais condições sejam satisfeitas pressupõe que possua características tais como reciclagem, ou seja, no sistema o que é resíduo ou lixo deve ser utilizado por outro. Assim o sistema mantém o fluxo de energia circulando em seu interior sem recorrer ao meio, não captando recursos e tampouco eliminando externalidades negativas;
b) Não há proeminências, isto quer dizer que o crescimento econômico não deve ser visto como essencial a obter a igualdade social;
c) As variáveis macroeconômicas, principalmente a expansão da Renda Agregada (Y) PIB devem permanecer dentro de uma banda de limites que mantenha a capacidade de auto-organização do Sistema de Gaia. Para que tal ocorra, outras variáveis que determinam a expansão econômica, tais como taxa de juros, população, volume de exportação, de consumo, expropriação de renda devem permanecer dentro de uma determinada banda. Extrapolar estes limites significa intensificar os impactos. O objetivo é encontrar parâmetros, pontos ótimos para que as variáveis não estrangulem o sistema de Gaia. Enfim, busca-se um equilíbrio dinâmico, estável, mantendo a sustentabilidade do sistema de Gaia e oportunamente do Sistema Capitalista;
d) A organização ocorre em forma de rede;

Para que tais condições sejam satisfeitas a) As empresas devem estar ligadas em rede, significando que deve haver alto nível de complementaridade entre elas; b) A energia e os resíduos devem circular dentro da economia reduzindo as emissões e emanações; c) As variáveis econômicas devem permanecer dentro de certos limites, busca-se a estabilidade de certos parâmetros (contrária então a tendências maximizantes tais como, maximização do crescimento econômico); d) O que é resíduo, originário ao consumo das famílias ou investimentos deve ser utilizado como insumo pelas empresas; e) Focar na produtividade do fator de produção terra (adoção de tecnologias brandas, energias renováveis, medidas de eficiência energética, agrupamento ecológico entre empresas, redução da utilização de combustíveis fósseis).
Quanto mais intensos os processos do sistema capitalista e quanto maior o nível de captação de recursos ao fator de produção terra, maior o nível de externalidades negativas, ou seja, maior o volume de emissões, mais distante, então do conceito de sustentabilidade ideal preconizado pelos sistemas vivos. Ao contrário, quanto menor a intensidade dos processos no interior do Sistema Capitalista, menor o grau de entropia, mais próximo da idéia de sustentabilidade. Logo, de forma ideal, sustentabilidade seria definida como a capacidade do Sistema Capitalista manter seu padrão de organização sem afetar a capacidade de auto-organização do Sistema de Gaia.
A aplicação dos princípios da ecologia, da vida, às instituições, mercados, indústrias e tecnologias, decorre necessariamente que as empresas devem ser organizadas em rede, reciclando, reutilizando insumos, de forma que aquilo que não serve a uma seja reutilizado por outra, elevar a produtividade dos recursos no âmbito da indústria, evitar desperdício de insumos, ao invés de concorrer mediante aumentos na produtividade do Capital (K) e Trabalho (L), concorrer mediante a produtividade do fator terra. A energia solar em suas várias formas deve ser a principal fonte de energia, aumentar a diversidade dentro da cadeia de empresas que assim concorre, pois daí sua permanência e seu desempenho, a rede fica mais difícil de ser quebrada. Gerar agrupamento ecológico de indústrias, focando mais na produtividade dos recursos.
Para tornar uma economia capitalista com uma configuração similar, correlata a da Avicennia deve-se fechar o sistema aos fluxos de matéria e energia obtendo assim um conceito ideal de sustentabilidade. Para isso deve-se recorrer a produtividade do fator de produção terra, ou reciclagem.


4 CONCLUSÕES

5 CONCLUSÕES

O presente trabalho tendo como tema as interações que se estabelecem entre Sistema Capitalista e Sistema de Gaia, situado no âmbito da Economia e Complexidade tratou em responder se é possível inferir a partir da Avicennia um modelo ideal de sustentabilidade.
Concluímos que a partir dos conceitos de laços retroalimentadores, redes, componentes, auto-criação, dentre outros possamos inferir um conceito ideal de sustentabilidade aos sistemas econômicos, podendo desta forma apresentar a Avicennia como um modelo perfeitamente sustentável aos sistemas sociais.
Concluímos ainda que os impactos ecológicos são intensificados devido a aplicações políticas econômicas fiscais e monetárias de caráter expansionista, devido à ênfase conferida a gastos do governo como meio de elevar o consumo e investimento e, consequentemente, os níveis de emprego e crescimento econômico.
Sendo assim, conclui-se que o sistema capitalista pode ser tratado como um sistema aberto, por se utilizar de fontes de recursos naturais, bem como eliminando externalidades negativas, como forma de manter seu padrão de organização de elevado consumo e crescimento econômico. Logo, possível então de ser descrito pela teoria das estruturas dissipativas.
Entende-se que políticas econômicas de inspiração keynesiana, centradas na ênfase aos gastos do governo como forma de atingir o pleno emprego dos fatores de produção, são deletérias, devido à utilização intensiva dos recursos naturais e pelo elevado grau de emissões e emanações decorrentes do processamento destes insumos.
Concluímos, ainda, que as relações interdependentes entre sistema capitalista e meio podem ser tratadas como uma derivação estrutural, onde os processos de consumo e investimentos, originados e estimulados no seio do sistema capitalista, alteram a estrutura deste, o que, por sua vez, altera a estrutura do meio onde o sistema se encontra inserido. Isto, oportunamente, de forma reiterada, impacta sobre o sistema capitalista dando origem a uma economia com tendências inflacionárias, com elevação de demanda por bens públicos e a incapacidade crescente do Estado em financiar os prejuízos advindos dos impactos ecológicos. Sendo assim, os sistemas se modulam de maneira complementar e congruente, onde as interações entre sistema capitalista e meio se caracterizam por uma interdependência dinâmica.
A contribuição notável deste trabalho se encontra no âmbito do comportamento das externalidades negativas, onde, a partir de um ponto crítico, estas se apresentam como auto-produtoras e auto-organizativas, devido à presença de laços catalíticos de auto-amplificação, ocorrendo não apenas em função do nível de atividade econômica presente ou da composição da demanda agregada, mas em função das externalidades de um período imediatamente anterior ou, ainda, em função da soma das externalidades de período anteriores, obscurecendo a fonte inicial de perturbação. Caracterizam-se, ainda, por serem irreversíveis e hipersensíveis a condições iniciais, ou seja, à composição e aos estímulos à demanda agregada.
Conclui-se, ainda, que mesmo não sendo iguais, há padrões dentro de padrões que são similares, onde a característica do sistema capitalista como um sistema aberto é válida em outras instâncias, no âmbito das economias capitalistas, dos sub-sistemas sociais, dos setores industriais, empresas e famílias, ou seja, tendo em comum entre si o fato que todos captam recursos ao meio e eliminam externalidades negativas com o intuito de manter seu padrão de organização.
Tais conclusões evidenciam que um mercado de externalidades ou o tratamento que vem sendo dado a estas questões, mediante a teoria do bem-estar social, se tornam ineficazes. Pois estabelecer um mercado de externalidades, dadas as suas dificuldades, não minora os impactos ecológicos, ao contrário, ao acreditar que se está oferecendo um tratamento adequado à questão, tende-se a postergar e obnublinar a fonte original do problema, (por exemplo, dadas as especificidades do comportamento das externalidades demonstradas neste trabalho, como calcular o preço de degelo das regiões antárticas? Como calcular o preço de emissões de dióxido de carbono se seus impactos não estão limitados a um único efeito e tampouco a um local? Posteriormente a quem responsabilizar por estes impactos? ). Sendo assim, concluímos que, para minorar a intensificação dos impactos ecológicos, a política econômica deve voltar-se no sentido de estimular a substituição de combustíveis fósseis por fontes de energias renováveis, fomentar o conhecimento de ativos ecológicos e o estabelecimento de arranjos produtivos ecológicos entre empresas de forma a reutilizar subprodutos e resíduos, focalizando na produtividade do fator de produção terra.
No entanto, no âmbito das medidas com o intuito de minorar os impactos, estagnar o crescimento econômico não deve ser tida como uma medida sustentável eficaz, principalmente às economias subdesenvolvidas, pois, ao reduzir o crescimento econômico, haverá de reduzir os níveis de emprego e consumo, refletindo numa medida geradora de instabilidades no sistema econômico, senão perversa à população das referidas economias, uma vez que, estas ocorrem a elevados níveis de desemprego, com salários baixos e estáveis. Nestes termos, os investimentos, o crescimento econômico devem ser qualificados, voltados para energias renováveis, tecnologias brandas, novos processos no âmbito das indústrias e alternativas de consumo. A discussão em torno da estagnação da atividade produtiva e da socialização das reduções de emissões deve levar em consideração o grau e a forma de desenvolvimento das economias, o grau de impacto que tal medida geraria em economias e populações mais pobres, bem como questões relativas à equidade.
No longo prazo, as medidas devem ocorrer no sentido de redistribuir a renda das economias desenvolvidas a favor das subdesenvolvidas e das elites das economias subdesenvolvidas a favor das camadas mais pobres e, paulatinamente oferecendo, alternativas de consumo, de investimento e tecnologias que minimizem tais impactos. Conclui-se que o Estado tende a uma incapacidade crescente de financiar os prejuízos advindos de tais impactos, bem como a gerar economias com tendências inflacionárias por motivos tais como, crescente escassez de recursos naturais e energéticos e pela perda de produtos alimentícios.
Depois de demonstrado como ocorrem as interações entre sistema capitalista e meio, conclui-se que o sistema capitalista é inerentemente entrópico, ou seja, faz parte da própria história, senão da natureza do sistema a intensificação dos impactos ecológicos. Desta forma, as soluções apresentadas, longe de resolverem o problema ou de esgotarem o assunto, possuem o objetivo de amenizar os impactos da atividade econômica. Apontam, ainda, a necessidade de se verificar uma forma mais completa a respeito de quais economias possuem maior peso nas emissões e na intensificação dos impactos ecológicos. Esta análise, no entanto, requer a explicação de como se deu a expansão da forma capitalista de produção a partir da revolução industrial. Sendo assim, há a necessidade de ser referenciada pela teoria da dependência econômica e verificar as possíveis explicações. Visto sob este aspecto, a principal conclusão a que se chega é que o problema ecológico e sua minoração tratam-se de um problema econômico com soluções político-econômicas.

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